quarta-feira, 7 de janeiro de 2015

16-"...também eu tenho uma história triste como a tua"

-Não te cheira a queimado?

-Sim, deve ser das velas. Devem estar a derreter.-Respondi, puxando-o para mim. Mas ele afastou-me para se levantar. Assim que se levantou fez uma cara de assustado.

-Que foi?

-Isto....está a arder! Isto está a arder! Ajuda-me!-As palavras custaram a sair-lhe da boca mas quando falou saiu tudo de repente e ele não se mexia.

-Vou chamar os bombeiros!-Respondi levantando-me rapidamente.

-Isso não! Está um extintor no corredor.-Um extintor? A nossa roupa já tinha ardido, o fogo estava a estender-se para o fundo da cama e depressa passaria para outras coisas do quarto e ele queria usar um extintor? E o que é que fazia ele pegado ao chão sem se mexer? Mas acabei por fazer o que ele pediu. Fui a correr e voltei a correr.

-Aqui tens! Mostra lá que sabes apagar fogos!-Ele não reagiu, não disse nada. Tive de ser eu. As chamas tinham acalmado e depressa consegui apagar o fogo.-Lorenzo? Lorenzo? O que é que se passa contigo?

-Nada.-Aquele nada saiu baixinho e ele parecia distante. Aproximei-me dele e peguei nas mãos dele que tremiam.-Estás bem?

-Sim. Secalhar é melhor irmos jantar fora.

-Foi a cama e não a cozinha que ardeu mas sim podemos.-Vestimo-nos em silêncio mas a verdade é que ele não estava bem. Notava-se no olhar que parecia muito distante e via-se que estava bastante pensativo.

Assim que chegámos ao restaurante sentámo-nos à mesa. O Lorenzo escolheu uma mais escondida. Ele continuava calado e eu preocupada. Fizemos os nossos pedidos e o silêncio voltou a instalar-se.
-O que é que se passa? O que é que se passou? 

-Nada.

-Nada? Tu parecias um daqueles bonecos do jogo do sims...quando há incêndios e não se mexem do mesmo sitio. 

-Não se passa nada. Calhou, já chega deste assunto.

-Então queres falar do que? Do facto de não teres aberto mais a boca desde ai? 

-Foi um dia complicado.

-Vou fingir que acredito nisso mas vou continuar preocupada.

-Não fiques. Em casa falamos, pode ser?

-Sim pode.

O jantar acabou por decorrer com alguma normalidade e lá fui conseguindo que o Lorenzo fosse falando durante o jantar. Regressámos logo a casa onde nos dirigimos para a sala. 
-Queres falar agora?

-Importas-te que vá só à casa de banho?

-Não, claro que não.-Ele saiu e eu fiquei sentada no sofá a pensar no que se estaria a passar. Ele demorava e quando eu pensava ir ver onde é que ele estava, ele voltou.-Ia para ir ter contigo, demoraste.

-Desculpa a demora.-Olhei-o nos olhos e não tive qualquer dúvida que algo se passava. Os olhos dele mostravam isso, ele tinha estado a  chorar.

-Lorenzo...tu estiveste a chorar. -Aproximei-me dele e o que fazer? Não sabia o que se passava e a única coisa que fiz foi abraçá-lo.

-Isto custa tanto. Obrigado.-Segurei na mão dele e puxei-o até ao sofá.

-Queres falar?

-Sabes...nós só estamos juntos à dois meses mas já te conheço muito bem e sei que algo se passa. E espero que saibas que acima de tudo, tens aqui uma amiga.

-Eu sei.

-Se preferires não falar, eu percebo.

-Lembras-te quando me contaste, na passagem de ano, da história do teu irmão que faleceu?

-Sim...

-Eu na altura preferi contar uma história minha verdadeira e simples mas, principalmente, que não mexesse comigo. Mas....também eu tenho uma história triste como a tua.-A admiração percebia-se pela minha cara, tinha-me passado pela cabeça tudo menos aquilo.

-Como a minha?

-Sim. Eu tenho mais três irmãos: o Marco, o Roberto e o António. Mas havia mais um, o Manu.

-O que é que aconteceu?

-O Manu tinha um ano quando morreu. Eu tinha 7 e a culpa foi toda minha. 

-Não digas isso. 

-Digo. É a verdade. Nunca me vou conseguir perdoar por isso.-As lágrimas escorriam-lhe pela cara, a ele e a mim. Todo aquele sofrimento dele, a dor da perda me fazia lembrar o meu irmão também.

*RECORDAÇÃO ON (Lorenzo)*
Era uma manhã de Inverno, daquelas geladas em que estar quente é quase uma tarefa impossível. Os nossos pais tinham saído para trabalhar. O Roberto (4 anos) e o Marco (3 anos) tinham ido para a escola. Eu estava em casa com o António (10 anos) e o meu irmão Manu que estava doente. Éramos todos muito novos mas o meu irmão mais velho já ficava muitas vezes encarregue de cuidar de nós e fazer o almoço, como era o caso de hoje.
-Lorenzo vou só comprar umas coisas para o almoço, dás um olho no mano?-Perguntou-me o António.

-Sim.-Ele saiu e eu fui logo para o quarto do Manu ver como ele estava. Toquei-lhe e estava gelado, provavelmente teria febre. Tapeio-o com mais uma manta mas nada de aquecer. Querendo ajudar e aquecê-lo, a única ideia que tive foi ligar o aquecedor que estava no quarto. Foi a pior decisão que alguma vez podia ter tomado, deu-se um pequeno curto circuito e de seguida uma grande chama que se estendeu ao berço do Manu. Não sei o que se passou comigo naquele momento, sei que bloqueei por momentos e só voltei a mim já com o António ao meu lado.

-Manuuuu!!!-Ele correu pelo quarto a dentro e tirou-o do berço. Ele tinha pequenas chamas na roupa, partes do corpo com queimaduras e os seus olhos fechados.-Chama uma ambulância!- Desta vez consegui agir rapidamente.

Assim que a ambulância chegou, colocaram-lhe logo uma máscara de oxigénio mas minutos depois as piores notícias chegaram. Ele tinha morrido devido a uma grande inalação de fumo e pelas queimaduras graves. 
Por vezes queremos ajudar e fazer o melhor mas só prejudicamos.
*RECORDAÇÃO OFF*

Assim que acabou de contar o que se tinha passado, ele chorava. Abracei-o novamente e limpei-lhe as lágrimas.
-Agora percebo a tua reacção à pouco. Mas não tens de te sentir culpado, foi um acidente e tu só querias ajudar.

-Acidente? Eu podia ter ficado sossegado mas...

-Mas querias ajudar.

-Durante muitos anos, o meu irmão odiou-me e os meus pais culpavam-me da morte dele.

-Eles deviam era ter estado ao teu lado.

-Talvez tenha sido a dor da perda. Só 5 anos depois é que me desculparam e tentaram fazer ver que tinha sido um acidente.

-E foi. Não quero imaginar o que tu com 7 anos e durante cinco anos passaste sozinho.

-Talvez os piores anos da minha vida. Cinco anos que me passaram ao lado, não conseguia ser uma criança normal com todo o peso da morte dele.

-Ainda não me perdoei a mim mesmo mas tento sempre mentalizar-me que foi um acidente.

-Desculpa eu ter insistido tanto contigo à bocado e ter gozado por teres bloqueado naquele momento, agora entendo tudo.

-Não tens de pedir desculpa, não sabias de nada.

-Como é que a relação com os teus pais e os teus irmãos?

-Com os outros sempre foi boa. Eles eram muito pequenos, sabem do que se passou mas nunca me acusaram de nada. Com o António tem vindo a melhorar cada vez mais. Com os meus pais é uma relação normal mas não sou de todo o filho preferido, acho que eles nunca vão perdoar-me verdadeiramente.

-Secalhar já perdoaram, esquecer é que é muito difícil. Impossível mesmo. Mas com o tempo tudo melhora, eu também estou aqui para quando fores abaixo.

-Obrigado mi amor.-Disse dando-me um beijo curto. Encostei a minha cabeça no peito dele.

-Quando é que conheço os teus irmãos?

-Quando quiseres. Tem é que ser com um de cada vez que com aqueles três é difícil encontrá-los todos juntos.

-Que me dizes de almoçarmos com um deles amanhã?

-Olha parece-me bem!-Ele ligou ao irmão e depressa combinaram tudo.-Então olha é assim...amanhã tenho treino, vocês vão lá ter e depois vamos almoçar, pode ser?

-Sim pode. Como é que vamos fazer agora com a cama?

-Tenho o outro quarto.

-E eu a pensar que ia dormir aqui neste pequeno sofá, agarrada a ti.

-Também podes dormir agarrada a mim mas na cama que eu não quero acordar com umas dores nas costas.

-Convenceste-me.-Trocamos um beijo e fomos até ao quarto. Ainda era cedo mas o Lorenzo queria descansar.

No Dia Seguinte...
O Lorenzo saiu cedo para o treino e eu ainda fiquei na cama. Só meia hora depois é que sai e me comecei a a arranjar.
Era 12h30 quando cheguei ao centro de treino e já encontrei o Lorenzo com o irmão.


-Bom Dia!-Qual não foi o meu quando reconheci aquela cara de algum lado, não sabia bem de onde.


-Bem, Roberto esta é a Anna, a minha namorada. Anna este é o Roberto, o meu irmão.-Cumprimentei-o com dois beijinhos e ficamos a olhar um para o outro.- A olharem dessa maneira um para o outro, acho que fico sem namorada num instante.

-Eu não te conheço?-Perguntei-lhe.

-Pois, eu também acho que te conheço.-Respondeu o Roberto.
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Olá a Todas!
Primeiro capítulo do ano! Espero que tenham gostado!
Fico à espera dos vossos comentários!
E muito obrigada a quem se mantém desse lado!
Beijinhos,
Sofia

3 comentários:

  1. Olá!
    Opá a sério?! Eu já me estava a rir com a situação mas tudo afinal não passou de uma história triste que o Lore passou :'c Tadinho, a Anna tem de cuidar dele e dar-lhe todo o apoio e mais algum!
    Nãããããão, que o Roberto não tenha sido um ex qualquer da Anna assim de uma noite qualquer, por favooor!! Ok, exagerei, mas não pode ser, inventa para aí alguma coisa fofa ou engraçada, mas nada de ex's assim de há muito tempo tá?!

    Quero muito o próximo, besitos, te quiero <3

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  2. OMG! Pobre Lorenzo... O que ele deve ter sofrido, tadinho :(
    De onde é que o Roberto e a Anna se conhecem? Fiquei curiosa
    Quero mais
    Por favor...
    Beijinhos
    Nana

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